Por que blefes aleatórios e bobos funcionam no poker? Skip to main content

Por que blefes aleatórios e bobos funcionam?

Você já se perguntou por que blefes “puros” funcionam e quando eles funcionam?

Por ‘puro’, quero dizer situações em que o jogador que está apostando não tem absolutamente nada (nem mesmo um draw), enquanto o jogador que acaba desistindo tem algo decente, digamos pelo menos um par.

Vamos considerar a seguinte situação em um cash game ao vivo de $5/$10 com $1000 de stacks efetivo na Califórnia. A ação rodou em fold até a Maria, que aumenta para $30 com Q♥ J♥ da posição intermediária e é paga por João do BB. Maria já jogou com João e sabe que ele é um loose-passive em posição que gosta de jogar muitos potes.

No flop vem (pot: $65): Q♠ 8♠ 5

João dá mesa e Maria dispara uma aposta de $40 para obter algum valor com seu par superior. Para sua surpresa, João aumenta forte para $200!

A ação está de volta para Maria, que acha que essa é uma linha muito pouco característica para João. Ele raramente aumenta sem uma mão forte como um trinca (ex: 55), dois pares (ex: Q8s) ou no mínimo um top pair com um kicker forte ou um overpair (ex: AA).

É claro que o fato de João ter feito um aumento gigantesco (cinco vezes maior do que a aposta inicial de Maria) também não é o fim do mundo para ela. Isso pode significar que João está tentando forçá-la a sair do pote ou que tem medo de que outra espada venha e, assim, sua mão possa perder para um flush. Aliás, Maria não acha que João tem um draw porque, se o fizesse, provavelmente teria dado call e esperado para completá-lo antes de colocar mais dinheiro no meio.

Tudo somado, parece que João está polarizado, isto é, ele está blefando ou tem uma mão muito grande. No entanto, uma vez que em sua estimativa, um blefe parece improvável nessa mão, então ela decide calmamente foldar seu top pair e viver para lutar outro dia.

Sem pestanejar, João – tendo ganho o pote – salta da cadeira e bate com a mão na mesa, mesmo sabendo muito bem que não precisava fazê-lo. T 2!

 “Eu tinha o Doyle Brunson! Eu não pude resistir!”

Maria imediatamente sorri e educadamente bate na mesa dizendo “Muito boa mão senhor!” Claro, Maria sabe que ela foi blefada da melhor mão. Mas como ela poderia saber disso antes do tempo sem ver as cartas de João?

A verdade é que ela não poderia ter, e provavelmente não há nenhuma maneira que ela faria em um lugar como este. João provavelmente faria o mesmo com todas as mãos fortes descritas acima (trinca, dois pares, etc.). Como há muito mais mãos legítimas do que blefes que João poderia ter nesse ponto, Maria sabe que tomou a decisão certa no longo prazo. Isso significa que, se ocorrer uma situação semelhante no futuro, ela será novamente foldar corretamente.

Dito isto, João mostrando suas cartas é muito útil para ela. Maria agora sabe que o T2 (de mesmo naipe, pelo menos) é uma mão que João gosta de jogar, então ela certamente irá incluí-lo em suas mãos potenciais na próxima vez que dissecar seu range!

Ok, até aí tudo bem. Mas voltemos à nossa pergunta original:

Por que o super blefe do João funcionou tão bem contra a grande jogadora Maria?

A resposta é: porque é raro!

Em outras palavras, o blefe de João é a exceção, não a regra. Se Maria tivesse observado que João blefava demais, ela nunca teria foldado a mão. A única razão pela qual Maria desistiu é porque ela sabe que João não blefa o suficiente naquele ponto!

Vamos fazer uma matemática rápida para confirmar isso, assumindo que as suposições de Maria estão corretas. Segundo ela, João poderia ter tido uma das seguintes mãos: AQ, Q8s, 88, 55 ou T2s.

Vamos também fazer uma análise de combinação sobre eles. Levando em conta que Maria já vê o Q em sua mão e o Q♠, 8♠, 5 no bordo, as combinações restantes devem ser:

  • AQ: 8 combos
  • Q8s: 2 combos
  • 88: 3 combos
  • 55: 3 combos
  • T2: 4 combos

Ao todo, Maria perde para 8 + 2 + 3 + 3 = 16 combos enquanto ela ganha de apenas 4. Isso é exatamente 4 para 1 contra ela. Já que estabelecemos que as pot odds eram próximas de 2-1, deve ficar claro que a taxa de insucesso é muito maior que a recompensa dela. A matemática diz que ela deveria desistir!

Também vale a pena notar que Maria não precisa saber com quais mãos João está blefando. Tudo o que ela precisa estimar é com que frequência ele blefa. Então, contanto que João blefe com menos de 8 combos de bluff puro (que é o limite onde sua taxa de falha seria igual à do pot odds: 2-1), ela deve desistir toda vez! Exatamente como ela fez.

Olhando mais fundo

Tecnicamente falando, a proporção acima (4 para 1) é um pouco imprecisa, já que não leva em conta a equidade de Maria no pote. Na verdade, a mão dela (Q  J  ) tem cerca de 25% de equidade contra o range de João descrito acima. Isso significa que sua taxa de falha é de apenas 3 para 1.

Dito isso, isso também não é exatamente preciso, já que João nem sempre deixa Maria ver as cartas do turn e do river, a fim de realizar sua equidade total. Em suma, a proporção de 4 para 1 é uma estimativa muito boa da situação.

Aliás, mesmo que Maria pense que João joga alguns de seus melhores draws da mesma maneira, sua decisão de desistir não deve mudar. Isso é devido ao fato de que combo draws tem uma tonelada de equidade contra um par e, em alguns casos, eles podem ser favoritos.

Por exemplo, se adicionarmos as seguintes mãos ao range de João {J♠T♠, J♠ 9♠, T♠ 9♠, 9♠ 7♠, 7♠ 6♠, 7♠ 5♠, 6♠ 5♠, 6♠ 4♠, 5♠ 4♠, 5♠ 3♠}, a equidade de Maria só melhoraria para 35%, o que significa que ela mal conseguirá empatar na melhor das hipóteses, e isso é  se João a deixar ver as duas cartas restantes!

Tendências de População

Para concluir, Maria deve desistir porque João não blefa bastante em situações como essas. Apesar do que o poker na televisão pode indicar, a experiência mostra que os blefadores de baixa frequência, como João, não são a exceção. Pelo contrário, eles são a regra na grande maioria das mesas de poker em todo o país e ainda mais em apostas menores.

Normalmente, os jogadores não blefam quase tanto quanto deveriam. Como resultado, suas ações de apostas estão, em média, muito mais próximas de serem “honestas” (ou seja, mãos de valor), em vez de serem “desonestas” (ou seja, blefes). Isto é o que eu gosto de chamar de Princípio da Honestidade. Uma versão abreviada seria:

O Princípio da Honestidade: em média e a longo prazo, Poker é um jogo honesto.

Por “honesto”, eu quero dizer que é mais honesto do que desonesto, no sentido de que apostas e aumentos são mais prováveis de ser orientados por valor, ao invés de se orientados pelo blefe, como descrito acima. Uma forma equivalente de afirmar o princípio é:

O Princípio da Honestidade: no geral, a comunidade de poker blefa muito menos do que deveria.

[learn_more caption=”Nota” state=”open”] A “comunidade do poker” inclui cada pessoa que joga poker, do mais inexperiente ao melhor jogador do mundo[/learn_more]

Por “deveria”, quero dizer, como ditado pelo que é chamado de Estratégia Teórica Ideal (ou GTO). Essa é uma estratégia infalível que garante (no mínimo) uma parcela justa de retorno para o jogador que o emprega, independentemente de como seus oponentes jogam. A ressalva é que não sabemos qual é essa estratégia ideal, embora saibamos que ela existe graças ao trabalho teórico do grande matemático John Nash. Dito isso, podemos aproximar essa estratégia “localmente”, concentrando-nos em determinados segmentos específicos do jogo, como o river, por exemplo. O que vemos a partir da experiência é que os humanos, em média, blefam muito menos do que deveriam. Em outras palavras, os seres humanos são desequilibrados de uma forma que favorece as apostas de valor sobre blefes, com a diferença de ser maior com jogadores menos experientes.

Isso é tudo para a primeira parte desse artigo. Semana que vem temos mais, com a segunda parte!

Artigo escrito por Konstantinos “Duncan” Palamourdas em 16 de Abril de 2019, para a Upswing.
Traduzido e adaptado por Luigi Soncin, para a ROYALpag.

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