Levante a mão se você tem a sensação de que toda vez que você tribeta com AK, o flop vai trazer três undercards.
Os potes com 3-bet são comuns, mas o valor de dinheiro envolvido desde o início deixa a coisa um pouco mais tensa.
Hoje vamos tentar aliviar esta tensão explicando a forma de como jogar em uma textura de board bem comum quando alguém faz o call de sua 3-bet.
Vamos focar em um board específico (T-8-6) que surgiu em uma mão jogada por um dos coaches da Upswing – Fried Meulders. Um aviso: esta análise vai ser bem avançada.
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Fundamentos
Em geral, como continuar no flop na maioria dos casos se baseia muito em um princípio bem simples e poderoso: a vantagem de range.
A vantagem do range se refere a quando seu range tem mais equidade que o range de seu oponente. Isto não deve ser confundido com a vantagem do nuts, que se refere ao range que inclui mais mãos muito fortes (dois pares, overpairs, top pairs com os melhores kickers, etc.).
Quando um jogador tem uma clara vantagem de range, este jogador deve ser agressivo. Estamos simplificando, mas de forma bem útil. Dito isso, o que acontece se o flop não for favorável pra gente?
Hoje vamos tratar exatamente disso, usando os vídeos explicativos das jogadas de Fried ”mynameiskarl“ Meulders, parte do curso de treinamento da Upswing Lab.
Mão jogada por “mynameiskarl“
Fried estava jogando $0,10/$0,25 (bem abaixo do stake normal dele), atendendo aos pedidos dos membros do Lab para que ele publicasse vídeos explicativos jogando low/micro stakes.
A mão inicia com nosso oponente no hijack position aumentando para $0,56 (2,24bb). Fried recebe A♣ K♦ no botão e faz o 3-bet para $1,91 (7,64bb). Nosso oponente faz o call e os dois jogadores veem o flop (102bb de stack no início da mão).
Flop
O flop traz T♥ 8♠ 6♦. Nosso oponente faz o check e Fried tem que tomar uma decisão.
Você apostaria ou faria o check nesta situação?
Fried decidiu pelo check.
Análise do flop
Em flops conectados como T♥ 8♠ 6♦, as coisas ficam um pouco mais complicadas.
Claro, ainda temos todos os overpairs em nosso range, o que geralmente não é o caso do nosso oponente. Mas quando se trata das mãos mais fortes que este flop tem a oferecer, estamos invadindo o território inimigo.
Embora possamos fazer o 3-bet com TT em algumas das vezes no botão, os sets mais baixos (88 – 66) são óbvios calls nesta posição. Nosso range pré-flop nesta situação pode ser visualizado abaixo:
Em um flop com T♥ 8♠ 6♦, nosso oponente provavelmente tem todos os sets em seu range se fizer o call de nossa 3-bet. E se estivermos enfrentando um oponente particularmente loose, calls preflop com mãos tipo T8s, 97s ou 86s não estão completamente fora de questão.
Como resultado, temos que abordar este flop com cautela, o que significa que não queremos fazer uma c-bet neste board. Fried concorda, afirmando que “começamos aqui com um check” e a partir daqui reavaliamos.
Entretanto, ele continua, observando que “mesmo quando em dúvida, fazer o c-bet de 33% do pote [com todo nosso range] em um pote que teve uma 3-bet ainda é uma boa estratégia.“ Isto serve de exemplo de para ilustrar a vantagem considerável em favor do agressor preflop, com mãos tipo QQ+ em seu range, principalmente quando combinado ao fato de estar em posição.
Via de regra, em potes heads-up, é muito difícil fazer algum estrago continuando com todo o seu range fazendo uma aposta baixa, salvo se o flop for muito complicado para você (tipo 5♥ 6♥ 7♥ quando você tem AK pretos).
Mas qual seria a estratégia de flop perfeita neste caso? Fried usa o software Simple Postflop para descobrir!
Análise do Simple Postflop
Acontece que Fried tem uma pequena vantagem em termos de EV neste flop. Mas, como suspeito, devemos fazer o check com frequência — aproximadamente 40% de nosso range. Em 46% das vezes nosso range faz o bet de 1/3 do pote, ao passo em que devemos apostar perto de 2/3 do pote em 14% das vezes:
As mãos que têm a maior ocorrência de check são os A-high e K-high sem mais nada. Isto ocorre principalmente porque não há draws, portando estas mãos são péssimas opções de blefe.
Uma mão como QJs, por outro lado, quase nunca é um check, e também apostamos com outros straight draws, tipo A9s, A7s, Q9s e J9s, em uma boa fração do tempo.
Ainda na categoria “não quero apostar tanto”, estão muitas de nossas mãos fracas – A8s, A6s, 77, 65s.
Entretanto, é interessante notar que se somarmos alguns pares e gutshots no mix (tipo 98s, 87s e 76s), o Simple Postflop recomenda apostar praticamente sempre. Isto pode ser explicado pela equidade adicional que estas mãos têm contra a parte mais forte do range do vilão.
Especificamente em relação à nossa mão, é obviamente uma mistura balanceada de checks e bets, e tudo se resume aos naipes. Esta é uma pequena diferença, mas A♦ K♠ bloqueia os backdoor flush draws de seu oponente, sendo portando uma c-bet mais rentável que A♣ K♣, por exemplo, que não tem este potencial.
Para proteger nosso range de check, não o tornando muito fraco, precisamos fazer o check também com algumas mãos fortes. Preferimos mãos que:
- Não sejam fortes o bastante para apostar nas três streets por valor (e que portanto incluem o check em algum momento).
- Não precisem de muita proteção.
Note que o Simple Postflop prefere apostar com J-J e Q-Q e nem sempre apostar com K-K e A-A. Isto ocorre porque J-J e Q-Q são muito mais vulneráveis a uma overcard no turn que os overpairs mais fortes.
Fazer o check de volta com um set para poder mostrar o nuts no river também é algo que deve ser feito vez ou outra.
Turn
Depois do check com A♣ K♦ no flop, o turn traz um 3♦ e nosso oponente toma a iniciativa, apostando em torno de dois terços do pote.
Análise do Turn
Determinamos que Fried terá muitas mãos feitas para fazer o call desta aposta no turn, de bottom pairs a sets. Mas isso é suficiente? E se não for, com quais outras mãos devemos nos defender? A♣ K♦ vai ser o suficiente?
Bem, é provável que sim.
Lembre-se que, além de nossas mãos feitas no flop, conseguimos obter um número de flush draws e um pair de três com A3s. Com isto, parece que estamos praticamente prontos no que se refere a saber as mãos para defender a aposta do turn:
É possível notar que praticamente qualquer coisa pior que A-K (que não seja um draw) é claramente um fold. Mais especificamente, A-J e A-Q são fold 100% das vezes. Por outro lado, A-K é fold na maioria das vezes, com alguns calls esporádicos.
Mais uma vez tudo se resume aos naipes, entretanto Fried indica que agora vamos abordar os detalhes mais específicos.
Quando aparece um flush no river, é bom ter um blocker para blefar. Mas este tipo de cenário é bem complexo. Algumas vezes estes efeitos sutis não estão muito claros e em uma simulação a lógica indica uma direção, e em outra simulação a lógica indica outra direção. Eu não perderia o sono tentando entender isto.
Assim, Fried opta pelo fold com A♣ K♦ e parte para a mão seguinte.
Considerações finais
A regra geral é que, quanto melhor for o flop para o seu range, maior deve ser a frequência em que você pode apostar — e vice-versa. Quando o board favorecer o jogador que faz o call, é hora de se precaver e trabalhar a defesa.
A coisa mais importante a ser lembrada é que, já que o pote será disputado em várias streets, é crucial começar a construir seu range de defesa no turn (e river) já no flop.
A combinação de boas mãos com check no flop, com draws e mãos feitas que você acertar no turn, fornece o subsídio para construir uma linha de defesa sólida contra as apostas de seus oponentes. Em muitos casos, esta combinação será praticamente tudo o que você terá em seu favor para continuar na mão, dificultando qualquer tipo de lucro fácil para seu oponente.
Até a próxima!
– Traduzido e adaptado da UpSwing Poker por Alex Sal